Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

25 de dezembro de 2015

Walt Whitman: Perfumados prados do meu peito













Perfumados prados do meu peito,
Colho as vossas folhas, escrevo, para melhor as estudar depois,
Folhas dos túmulos, folhas do corpo crescendo sobre mim, sobre a morte,
Raízes vivas, altas folhas, oh o inverno não vos enregelará, delicadas folhas.
De novo floresceis todos os anos, de novo saindo do vosso retiro;
Eu não sei se muitos ao passar vos hão-de descobrir ou aspirar tão 
          suave aroma, mas sei que alguns o farão;
Oh delicadas folhas! Flores do meu sangue! Falai à vossa maneira do coração
que por baixo tendes,
Eu não sei qual o vosso subterrâneo sentido, não sois a felicidade,
Sois muitas vezes tão cruéis que não vos posso suportar, queimais-me e feris-me,
E, todavia, que bela sois aos meus olhos, raízes levemente coloridas, fazendo-me
pensar na morte,
A julgar  por vós a morte é bela, (enfim, que haverá de mais belo senão a morte
e o amor?),
Oh creio que não é em louvor da vida que aqui canto o meu canto de amantes,
creio que é em louvor da morte,
Pois, como é sereno, como floresce solenemente ao elevar-se à atmosfera
dos amantes!
Vida ou morte, tanto me faz, a minha alma recusa-se a escolher,
(Talvez a alma sublime dos amantes prefira a morte),
Na verdade, ó morte, penso que estas folhas significam o mesmo que tu,
Crescei, doces folhas, para que vos possa ver! Crescei sobre o meu peito!
Abandonai o coração que aí se oculta!
Não vos enredeis, tímidas folhas, em vossas rosadas raízes!
Não vos quedeis aí, envergonhadas, ervas do meu peito!
Vinde, estou decidido a desnudar este amplo peito, tanto tempo o reprimi
e sufoquei;
Emblemáticas e caprichosas folhas, deixo-vos, pois já não me sois úteis,
Sem rodeios direi o que tenho a dizer,
Só a mim e aos companheiros hei-de cantar, jamais atenderei outra voz que
não a sua,
Despertarei ecos imortais em todos os estados do meu país,
Aos amantes darei um exemplo que seja para sempre forma e vontade em todos
os estados do meu país,
Pronunciarei as palavras que exaltem a morte,
Dá-me então a tua música, ó morte, para estarmos em harmonia,
Dá-te a mim porque agora sei que acima de tudo me pertences e que tu e o amor
estão inseparavelmente unidos,
Não permitirei que me enganes mais com isso a que chamava vida,
Porque enfim compreendo que és os conteúdos essenciais,
Que, por qualquer razão, te escondes nestas mutáveis formas de vida, e que
elas existem sobretudo para ti,
Que, para além delas, surges e permaneces, tu, realidade real,
Que, sob a máscara das coisas materiais, aguardas pacientemente, não importa
quanto tempo,
Que, talvez um dia, tudo dominarás,
Que talvez dissipes todo este imenso desfile de aparências,
Que talvez seja para ti que tudo existe mas não perdura,
Mas tu perdurarás.



Walt Whitman
USA 1819-1892
Trad. José Agostinho Baptista
in Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro
Editor: Assirio & Alvim
photo by Google

Pedro Salinas: Quanto sabe a flor!

   Quanto sabe a flor! Sabe ser branca
quando é jasmim, e roxa quando é lírio.
Sabe abrir o botão
sem reservar doçuras para si,
ao olhar ou à abelha.
Permite sorridente
que se faça mel com sua alma.
Quanto sabe a flor! Sabe deixar-se
colher por ti, para que tu a leves,
erguida, em teu peito numa noite.
Sabe fingir, quando no dia seguinte
de ti a afastas, que não é a mágoa
por tu a abandonares que a faz murchar.
Quanto sabe a flor! Sabe o silêncio;
e possuindo uns lábios tão formosos
sabe calar o «ai!» e o «não», e ignora
a negativa e o soluço.
Quanto sabe a flor! Sabe entregar-se,
dar, dar tudo o que é seu a quem a quer,
sem pedir mais que isso: que lhe queira.
Sabe, simplesmente sabe, amor.




Pedro Salinas
Espanha, Madrid 1891 – EUA, Boston 1951
in Rosa do Mundo -  2001 Poemas Para o Futuro
Trad. de José Bento
Editor: Assirio & Alvim
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António Botto: Canção


Se fosses luz serias a mais bela
De quantas há no mundo: – a luz do dia!
- Bendito seja o teu sorriso
Que desata a inspiração
Da minha fantasia!
Se fosses flor serias o perfume
Concentrado e divino que perturba
O sentir de quem nasce para amar!
- Se desejo o teu corpo é porque tenho
Dentro de mim
A sede e a vibração de te beijar!
Se fosses água – música da terra,
Serias água pura e sempre calma!
- Mas de tudo que possas ser na vida,
Só quero, meu amor, que sejas alma!



António Botto
Portugal, Concavada 1897 
Brasil, Rio de Janeiro 1959
in Canções e outros poemas
Editor: Edições Quasi
photo by Google 

António Feijó: Epílogo

Como um cativo, aqui te deixo, Pensamento,
As asas de oiro amarfanhadas,
Com o esforço que fiz de forma e sentimento,
Nestas estrofes mal rimadas...

Os meus olhos, a noite imensa perscrutando,
Viram-te belo e refulgente;
E ao teu contacto, a Alma em trevas, despertando,
Iluminou-se de repente.

A cadeia, que ao lodo obscuro a tinha presa,
Fundiu-se ao beijo que lhe deste;
E a alma liberta, ao sol da Graça e da Beleza,
Abriu, cantando, a asa celeste!

Descendo para mim doutras esferas, vinhas
Banhado ainda em luz sublime;
Via-te bem, sentia os encantos que tinhas,
Mas a palavra não te exprime.

E quem hoje te vê, n'estas imagens frias,
Encarcerado em duro engaste,
Nem por sombras supõe com que esplendor fulgias,
Quando aos meus olhos te mostraste!

Nem as outras visões que ficaram sem forma
Em nebulosa inconsistente,
A espera d'essa luz que ao vir de ti transforma
O pó da terra em oiro ardente...




António Feijó
Portugal, Ponte de Lima 1859 – Suécia, Estocolmo 1917
in “ Sol de Inverno “ seguido de vinte poesias inéditas
Introd. Álvaro Manuel Machado
Editor: Imprensa Nacional-Casa da Moeda
photo by Google

28 de novembro de 2015

Eugénio de Andrade: As Palavras

 As Palavras
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm,
cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?



Eugénio de Andrade
Portugal, Póvoa de Atalaia 1923 – Porto 2005
in Poesia
Editor: Fundação Eugénio de Andrade
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Fernando Pessoa: Mar Português


Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.



Fernando Pessoa
Portugal, Lisboa 1888-1935
in Mensagem
Editor: Ática
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Ugo Betti: Pecado Original




























A luz sobre os calmos mares
lentamente difundiu-se;
Dormiam como cerradas folhas
os continentes solitários.
E adiantaram-se as duas criaturas
Amedrontadas, dando-se a mão,
por dentro do silêncio e da frescura.

Aos seus passos, como uma pomba
desaninhada o eco elevou-se, depois emudeceu.
Timidamente abriram a ramagem...
espiaram a cava sombra das águas...
e naquela sombra avistaram dois rostos
que subiam fremendo
por entre os céus revoltos.

Então, com grande pasmo e medo,
olharam-se, tocaram-se,
Nus estavam, entre o céu e as rochas
e arripiavam-se, como ao vento,
Dentro dos torsos de argila
Inchava-se uma ignota
tristeza, com o mugir da onda...
Depois caíram. E gravaram a lama
com indelével cunho.



Ugo Betti
Itália, Camerino 1892- Itália, Roma 1953
Trad. Hermínia Ferreira
in Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro
Editor: Assirio & Alvim
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Jaime Sabines: Eu não sei ao certo…





















Eu não sei ao certo, mas suponho
que uma mulher e um homem
um dia se amam,
vão ficando sozinhos pouco a pouco,
algo em seu coração lhes diz que estão sós,
sós sob a terra se penetram,
vão-se matando um ao outro.

Tudo se faz em silêncio. Como
a luz se faz dentro dos olhos.
O amor une corpos.
Em silêncio vão-se enchendo um ao outro.

Qualquer dia acordam sobre braços;
pensam então em tudo.
Vêem-se nus e sabem tudo.

(Eu não sei ao certo. Suponho-o).



Jaime Sabines
México, Tuxtla Gutiérrez 1926 – Cidade do México 1999
Trad. José Bento
in Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro
Editor: Assirio & Alvim
photo by Google

Fleur Adcock: Mulher para Marido

Da ira para o poço do sono
Deslizas de repente. A calma
Cai em mim gradualmente, um nevão
Suave, uma capa leve para atordoar
Os nervos arrepanhados, durante algum tempo.

A tua cabeça na almofada virada para o outro lado;
A minha cara escondida. Mas debaixo da neve
Rebentos endireitam-se, o filamento verde
Ergue-se instintivamente. Não se duvide
Dessa virtude de determinação na carne insciente:
Entre os nossos corpos uma tepidez cresce;
As mãos mexem-se debaixo dos cobertores,
As tuas costas tocam o meu peito, as nossas coxas
Rodam para encontrar o lugar que conhecem.
A tua boca move-se sobre a minha cara:
Ousaremos, agora, abrir os olhos?



Fleur Adcock
Nova Zelândia, Auckland 1934
Trad. José Alberto Oliveira
in Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro
Editor: Assirio & Alvim
photo by Google

António Feijó: Moiro e Cristã


O pobre moiro enamorou-se
De Ely, moça cristã, sendo filho do Emir...
Tamanha dor sentiu, que o mísero exilou-se,
Como se alguém pudesse à própria dor fugir!

Longe, na terra alheia, abrasa-lhe a memória
A imagem da mulher que a vida lhe prendeu,
Vendo-a morta, a sorrir sob um nimbo de glória,
Mas no esplendor de um céu que nem mesmo era o seu...

Por sua vez, Ely nunca pôde esquecê-lo,
E nesse imenso amor, com presságios de agoiro,
Sentia-se morrer, como um lírio no gelo,
Sem o doce luar dos seus olhos de moiro...

Mas no instante supremo, ambos crentes, temendo
Que a Morte os separasse, em tão opostos céus,
Ele invocou Jesus, cheio de fé, morrendo;
E a cristã murmurou: «Alá! só tu és Deus!»





António Feijó
Portugal, Ponte de Lima 1859 – Suécia, Estocolmo 1917
in “ Sol de Inverno “ seguido de vinte poesias inéditas
Introd. Álvaro Manuel Machado
Editor: Imprensa Nacional-Casa da Moeda
photo by Google

António Feijó: A resposta do árabe




















«De que país és tu?» -- A um árabe dizia
Sahid, filho d'Agbá, na estrada, ao fim do dia.

Era a hora em que o sol se fecha no Ocidente
Como o olhar moribundo e triste d'um doente.

E o árabe respondeu, banhado na piedosa
Claridade da luz, quase religiosa:

-- «Sou da raça que tem o excepcional fervor
D'amar eternamente e de morrer d'amor.» --

-- «Então és tu de Asrá.»-- acrescentou Sahid;
-- «Sim, por Caaba! Foi essa a tribo onde eu nasci.»

E de novo Sahid o interrogava atento:
-- «Por que motivo, pois, tão nobre sentimento

Nunca se muda em vós n'uma paixão nefasta? »--
O crepúsculo enchia o céu meio estrelado,
E o árabe tornou, como que iluminado:
-- «Porque a mulher é bela e a juventude é casta!»




António Feijó
Portugal, Ponte de Lima 1859 – Suécia, Estocolmo 1917
in “ Sol de Inverno “ seguido de vinte poesias inéditas
Introd. Álvaro Manuel Machado
Editor: Imprensa Nacional-Casa da Moeda
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António Feijó: Princesa Encantada


























Formosa Princesa dormia há cem anos;
 Dormia ou sonhava... Ninguém o sabia.
 Passavam-se os dias, passavam-se os anos,
 E a linda Princesa dormia, dormia,
     Dormia há cem anos!

 Em torno, sentadas, dormiam as Damas,
 Cobertas de joias, cobertas de lhamas;

 Com formas e aspectos de finas imagens,
 Esbeltos e loiros, dormiam os pajens.

 E ás portas de bronze, por terra alabardas,
 Num sono profundo dormiam os guardas.

 Lá fora, na sombra dos parques discretos,
 Nem aves gorjeiam, nem zumbem insectos.

 As arvores sonham, na sombra dos poentes,
 Imóveis, à beira dos lagos dormentes.

 E as fontes que d'antes sonoras gemiam,
 Sonâmbulas mudas, apenas corriam...

 Um dia, de longe, de terras distantes,
 Com pajens, arautos, donzéis, passavantes,

 Bandeiras ao vento, clarins, atabales,
 Ecoando a distancia por montes e vales,

 --Um príncipe, herdeiro d'um trono potente,
 Com olhos suaves d'aurora nascente,

 Excelso e formoso, magnânimo e moço,
--Correndo aventuras, num grande alvoroço,

 Chegou ao Castelo, que ha tanto dormia,
 Como uma alvorada, prenuncia do dia...

 E ao ver a princesa, sentada em seu trono,
 Naquele profundo, extático sono,

 Tomado d'estranha, indizível surpresa,
 Na boca entreaberta da linda Princesa,

 Tremendo e sorrindo, seu lábio colou-se
 N'um beijo, que ao lábio a alma lhe trouxe.

 Acorda a Princesa; despertam as Damas,
 As faces ardentes, os olhos em chamas.

 Despertam os Pajens, nos seus escabelos,
 Com halos de fogo nos loiros cabelos.

 Acordam os guardas; e, tudo desperto,
 A vida renasce no parque deserto.

 Suspiram as fontes; gorjeiam as aves,
 Das áleas profundas nas sombras suaves.

 As arvores tremem, no ar transparente,
 Á brisa que sopra, como hálito ardente.

 Nas torres, os sinos repicam de festa;
 O povo em coreias enchia a floresta...

 E a linda Princesa, seus olhos fitando
 No Príncipe excelso, sorrindo e corando,

--« Sonhava contigo...» Porque é que tardaste?
 Mas já nesse instante, formando contraste,

 Quando isto dizia, erguendo-se a medo,
 A voz parecia trair o segredo

 De quem, num relance, talvez lamentasse
 Que sonho tão lindo tão cedo acabasse!...

 A linda Princesa sonhava há cem anos,
 E fora do Sonho só há desenganos...



António Feijó
Portugal, Ponte de Lima 1859 – Suécia, Estocolmo 1917
in “ Sol de Inverno “ seguido de vinte poesias inéditas
Introd. Álvaro Manuel Machado
Editor: Imprensa Nacional-Casa da Moeda
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António Feijó: O romance da pastora linda





A linda Pastora, guardando o seu gado,
Andava esquecida num alto montado.

E o Rei, que voltava, sombrio, da caça,
Com seus falcoeiros e galgos de raça,

Detém-se, pensando, de súbito, ao vê-la,
Em ermo tão alto, que fosse uma estrela.

-- «Oh linda Pastora dos olhos castanhos,
Que passas a vida guardando rebanhos!

A tua beleza deslumbra os meus olhos,
Como uma tulipa no meio de abrolhos.

Teus lábios parecem cerejas vermelhas,
E a pele é mais fina que a lã das ovelhas.

Sobre o oiro das tranças, tuas faces tão puras
São duas papoilas em searas maduras.

Estrela ou Pastora, se queres ser minha,
Terás as riquezas que tem a Rainha!»

-- «A flor dos valados é sempre modesta
E a humilde zagala presume de honesta.»

-- «Terás equipagens, palácios, castelos,
E joias a arderem nos fulvos cabelos;

Um trono de esmaltes em oiros maciços,
Lacaios, escravos, fidalgos submissos!...»

-- «Às vossas riquezas, perdidas nos montes,
Prefiro mirar-me no espelho das fontes;

As joias, que valem, se eu guardo o meu gado,
Com rubras papoilas a arder no toucado?...

De nada me servem fidalgos, escravos,
Pois tenho as abelhas e o mel dos meus favos.

Segui vosso rumo, que a tarde caminha;
Guardai as riquezas que são da Rainha».

-- «Não rias, vaidosa, das minhas promessas,
Que a forca tem visto mais lindas cabeças...»

-- «Talvez que mais lindas já visse pender,
Mas nunca tão firme nenhuma há-de ver,

Que a Virgem Santíssima, a Virgem clemente,
Ampara, sorrindo, quem morre inocente,

E os anjos, descendo do céu a voar,
Á forca viriam minha alma buscar!»

E a linda Pastora, que a ser ultrajada
A morte prefere,--vai ser enforcada!

Levaram-na, á força, das suas ovelhas,
Pendendo-lhe ás tranças papoilas vermelhas,

Com gritos de escárnio, no meio da turba...
Mas nada os seus olhos serenos perturba.

E toda inundada na luz que irradia,
Sorrindo, os estrados da forca subia...

Então, n'um relance, do azul transparente,
Surgindo mais alvas que a lua nascente,

Duas pombas que descem e voam a par,
Nos braços da forca vieram poisar...

E a linda Pastora dos olhos castanhos,
Tão longe da serra, cercada de estranhos,

Sem ter um gemido, sem ter um lamento,
Expira na forca... Mas nesse momento,

No grande silencio que a morte causara,
Aos olhos de todos que atónitos viram
Tão grande prodígio, coragem tão rara,
Dos braços da forca--três pombas partiram!



António Feijó
Portugal, Ponte de Lima 1859 – Suécia, Estocolmo 1917
in “ Sol de Inverno “ seguido de vinte poesias inéditas
Introd. Álvaro Manuel Machado
Editor: Imprensa Nacional-Casa da Moeda
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