Seguindo o critério rigoroso dos ocultistas, mas
aplicando-a fora de exacta conformidade entre
os planos, alguns têm sustentado que em todos
esses
planos se deve aplicar a regra de Faz o que
Queres.
Mas este «que queres» implica o conhecimento
preliminar de Vera Vontade.
No animal, que é todo instinto, substancialmente,
e em quem a Vera Vontade é a vontade do
instinto, a
vida dos dois instintos, de conservação e de
reprodução
representa, deveras, a verdadeira vida de
vontade.
Mas isso não é preciso ensinar aos animais.
No homem superior, isto é, no homem criador,
também a vontade vera está clara no seu
destino
de criador, se bem que os obstáculos
adquiridos
na passagem pelo simples homem continuamente
perturbem a expressão, e até a descoberta, da
simples vontade sua.
No homem vulgar, porém, Faz o que Queres
não significa a mesma coisa, por isso que o
homem vulgar é uma individualidade superior
infantil, e as crianças não têm Vera Vontade.
Dizer, portanto, ao homem vulgar que faça o
que é por ele em geral interpretado como
que faça o que lhe agrada, sem atenção
aos outros, nem escrúpulo moral para
consigo mesmo. Ora isto está errado.
A verdadeira vontade □
Fernando Pessoa
Portugal 1888-1935
in Prosa Íntima e de Autoconhecimento
(Reflexões pessoais)
Edição Rui Zenith
Edit. Assirio & Alvim
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